Oposição venezuelana diz ter prova incontestável de vitória e convoca manifestação

  • 29 de julho de 2024

Com quarenta minutos de atraso, María Corina Machado compareceu a uma coletiva de imprensa em Caracas nesta segunda-feira, 29, para compartilhar informações “grandiosas”. Segundo a líder oposicionista da Venezuela, foi possível obter dados o suficiente sobre as eleições da véspera para “provar a verdade”, declarando, ao lado do principal candidato da coalizão que desafiou o regime de Nicolás Maduro, Edmundo González Urrutia, que ele é o novo presidente eleito com mais de 73% dos votos.

“Hoje me sinto profundamente orgulhosa de ser venezuelana. E temos grandiosas informações a compartilhar. É um milagre. Digo a todos os venezuelanos dentro e fora do país e todos os democratas do mundo: já temos como provar a verdade. Após 24 horas de trabalho ininterrupto, nossa equipe fez algo excepcional”, declarou María Corina. “Todas as atas, à medida que as vamos recebendo, são verificadas, digitalizadas e colocadas em um site robusto. Neste momento, temos 73,23% dos votos. Nosso presidente eleito é Edmundo González Urrutia. Mesmo se o resto dos votos que não conseguimos verificar fossem todos no Maduro, não seria o suficiente para ele ganhar. Esse resultado prevaleceu em todas as regiões da Venezuela.”

Segundo ela, a oposição já tem em mãos 73,2% de todas atas, recuperadas por testemunhas de mesa (ou fiscais eleitorais). Com base nisso, Corina garantiu que Maduro obteve 2.759.256 votos contra 6.275.180 de González. “A diferença foi esmagadora”, pontuou.

A ex-deputada, que venceu as primárias da oposição mas foi inabilitada a concorrer à presidência pelo regime chavista, afirmou que foi criado um portal na internet onde “cada venezuelano poderá validar qual foi seu voto e o resultado que corresponde a ele”. De acordo com ela, “vários líderes mundiais já estão consultando esse portal e vão comprovar os resultados”. O endereço do site não foi divulgado durante a coletiva de imprensa.

“Houve eleições fraudulentas na Venezuela, mas nunca tivemos provas como agora”, concluiu.

Mais cedo, Corina já havia contestado a vitória de Maduro, declarando a vitória de González e acusando o presidente bolivariano de fraudar as eleições. No primeiro pronunciamento após a publicação dos resultados, ela também qualificou os dados oficiais de “impossíveis” e cobrou as Forças Armadas para fazerem respeitar a soberania do voto.

Falando depois de Corina, González prometeu que, ao lado da população, vai “lutar pela nossa liberdade” – mas também pediu por moderação na reação à “injustiça”.

“Falo com vocês com a tranquilidade da verdade. Quero dizer que a vontade expressada ontem, a faremos respeitar. Esse é o único caminho para a paz. Temos nas mãos as atas que demonstram nosso triunfo categórico e matematicamente expressivo”, afirmou o candidato da oposição. “Nosso triunfo é histórico: ganhamos em lugares onde nunca haviam vencido as forças democráticas nesse país.”

Ele continuou, referindo-se aos protestos contra Maduro que começaram a pipocar no país nesta segunda-feira: “Vamos lutar por nossa liberdade. Entendo sua indignação, mas nossa resposta é de calma e firmeza. A Venezuela deseja paz e reconhecimento da vontade popular, por isso é fundamental que as autoridades respeitem a expressão das urnas. Hoje, mais que nunca, é fundamental que todos os setores democráticos se mantenham firmes e coordenados.”

Os apoiadores presentes no evento receberam as notícias com gritos de “Liberdade, liberdade!” e, em referência a Maduro, entoando as palavras: “Esse governo já caiu”.

Convocação de protestos

Enquanto isso, a capital Caracas foi tomada por protestos após o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) proclamar Maduro oficialmente reeleito. Mais cedo, já haviam ocorrido panelaços. De acordo com a oposição, o movimento não foi incentivado por figuras políticas, e as manifestações possuem caráter espontâneo.

Houve intensa movimentação em favelas e bairros populares da capital. Em Petare, outrora um reduto do chavismo, os manifestantes entoavam gritos contra Maduro. “Este governo vai cair” e “entregue o poder agora”, cantavam os manifestantes. A polícia respondeu com gás lacrimogêneo às multidões, tentando dispersar os protestos. De acordo com a televisão venezuelana VPItv, com sede nos Estados Unidos, ao menos 13 pessoas foram presas nas “manifestações pacíficas”.

Na declaração à imprensa, Corina chamou os protestos de “expressões de cidadãos que resistem a que roubem seu futuro, expressões legítimas frente a um regime ilegítimo”. Diante disso, ela convocou todos os venezuelanos do país a uma manifestação na terça-feira, 30, entre às 11h e 12h locais (12h e 13h em Brasília), “para mostrar a força e a maioria que somos”.

Vitória de Maduro

Na madrugada desta segunda, o CNE, órgão federal controlado pela ditadura, apontou vitória de Maduro com 51% dos votos, contra 44% do candidato oposicionista, Edmundo González Urrutia, que substituiu María Corina Machado, vencedora das primárias da oposição, após ser inabilitada pelo regime chavista. Em contraste, levantamentos de boca de urna sugeriram que o rival de Maduro teria vencido o pleito com 65% de apoio, contra apenas 31% do líder bolivariano. O vice-presidente da Edison Research, empresa que conduziu o levantamento com 8 mil entrevistas em 100 centros de votação, afirmou que seria preciso “muita fraude” para produzir um cenário inverso.

Além disso, Corina afirmou que, com base nas atas às quais a coalizão de onze partidos que desafiou Maduro nas urnas conseguiu ter acesso, os dados indicavam que González teria 70% dos votos, contra 30% de Maduro.

O principal ponto de questionamento da oposição e da comunidade internacional é que o regime não divulgou os resultados na totalidade, sem a publicação das atas das zonas eleitorais – relatórios que reúnem informações de cada centro eleitoral. Como forma de protesto, moradores de várias cidades venezuelanas fizeram panelaços contra a reeleição do presidente nesta manhã. Em Caracas, um dos locais de contestação foi o bairro de Petare, outrora bastião do regime chavista, onde a manifestação durou mais de 20 minutos.

Contestação internacional

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, apelou nesta segunda-feira ao governo de Maduro para contar os votos da eleição na Venezuela com “transparência total”, dizendo que “incentiva a publicação prontamente dos resultados eleitorais e o detalhamento por colégios eleitorais”.

O Centro Carter, principal organização internacional que acompanhou as eleições na Venezuela, também pediu nesta segunda-feira que o CNE publique imediatamente as atas das mesas de votação do pleito de domingo 28. De acordo com a organização, “a informação das atas transmitidas ao CNE é indispensável para nossa avaliação e fundamental para o povo venezuelano”.

O Itamaraty foi na mesma linha. Apesar de exaltar o “caráter pacífico” da votação, evitou referendar a vitória do atual presidente, Nicolás Maduro, anunciada na madrugada desta segunda-feira pelo Conselho Nacional Eleitoral e questionada pela oposição.

No comunicado, o governo brasileiro diz que é preciso observar o princípio da soberania popular “por meio da verificação imparcial dos resultados” e que aguarda, “nesse contexto”, a publicação do órgão eleitoral venezuelano de dados desagregados por mesa de votação. Segundo a nota, esse é um “passo indispensável para a transparência, credibilidade e legitimidade do resultado do pleito”.

O secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, também manifestou “grave preocupação” com a possibilidade de os números oficiais não representarem a realidade, pedindo apuração “justa e transparente”. 

“Os Estados Unidos têm sérias preocupações de que o resultado anunciado não reflita a vontade nem os votos do povo venezuelano e pedem que as autoridades eleitorais publiquem uma relação detalhada dos votos”, afirmou Blinken.

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