Presidente do Conselho do Corinthians faz cobranças e pede transparência a Augusto Melo

  • 19 de setembro de 2024

O presidente do Conselho Deliberativo do Corinthians, Romeu Tuma Jr., fez cobranças institucionais a Augusto Melo, presidente do clube, em ofício enviado na última terça-feira. No documento, Tuma Jr. elenca três preocupações centrais, nas quais questiona possível falta de transparência e desobediência ao Estatuto do clube alvinegro.

No primeiro ponto, Romeu Tuma diz que chegou ao conhecimento dele e de conselheiros que a Alvares & Marsal, empresa na qual o CEO do clube, Fred Luz, é sócio, teria orientado a gestão Augusto Melo de ajuizar uma ação cautelar extrajudicial de Recuperação Judicial ou algo semelhante.

Procurado, o Corinthians diz que Fred Luz nega ter sugerido a ação

A ação cautelar a qual o presidente do Conselho se refere seria uma forma de a diretoria se proteger de eventuais execuções de dívidas, bloqueios de contas e penhoras de bens do clube por 60 dias. Também seria um primeiro passo rumo à recuperação judicial, processo que permite que companhias suspendam e renegociem parte das dívidas, evitando o encerramento das atividades, demissões e falta de pagamentos.

Augusto Melo, presidente do Corinthians, no Dia da Transparência — Foto: José Edgar de Matos

Augusto Melo, presidente do Corinthians, no Dia da Transparência — Foto: José Edgar de Matos

Adotar uma recuperação judicial é uma possibilidade discutida há meses no Corinthians, mas que enfrenta resistências internas.

Contrário a essa medida, o presidente do Conselho Deliberativo usa o Coritiba como exemplo. O clube paranaense também contratou os serviços da Alvares & Marsal e, de acordo com Tuma, os efeitos da recuperação judicial não foram benéficos ao Coxa.

Vale lembrar que Tuma já havia se posicionado de forma contrária à contratação de Fred Luz como CEO do Corinthians, apontando conflito de interesses. Após impasse, o profissional assinou contrato como consultor do Timão.

No ofício, Tuma Jr. ainda alerta que “seria temerário” realizar esta ação sem consulta prévia ao Conselho Deliberativo e ao CORI (Conselho de Orientação Fiscal). Há receio nos bastidores do clube de que esse movimento possa trazer danos institucionais.

Ainda no documento enviado a Augusto Melo, Romeu Tuma Jr. cita o plano da criação de um Fundo Imobiliário para a Neo Química Arena. O presidente do Conselho destaca que tal projeto também dependeria da autorização dos dois órgãos.

Não houve apresentação deste projeto, citado publicamente na entrevista coletiva do Dia da Transparência, para o Conselho Deliberativo, segundo Romeu Tuma Jr.

Há ainda insatisfação sobre falta de “respostas” sobre questionamentos realizados por conselheiros e o descumprimento de questões de transparência, como a falta de prestação mensal de contas aos conselheiros.

Em contato por meio de nota, o presidente Augusto Melo diz que “recebeu o ofício enviado pelo presidente do Conselho Deliberativo, Romeu Tuma Jr, e responderá internamente, dentro dos prazos previstos pelo estatuto do clube”.

Confira na íntegra o ofício enviado por Tuma a Augusto Melo:

Senhor Presidente,

Tendo chegado ao meu conhecimento e a ao conhecimento de diversos Conselheiros do Sport Club Corinthians Paulista que a Empresa Alvares & Marsal, através de seu representante em nosso Clube, estaria orientando a Administração a contratar escritório de Advocacia no sentido de ajuizar ação cautelar extrajudicial de Recuperação Judicial ou algo semelhante, fato que já ocorrera no Coritiba Foot Ball Club com a mesma empresa, cujos resultados, segundo informações, não foram benéficos àquela agremiação desportiva, alerto Vossa Senhoria que de acordo com nosso Estatuto seria temerário faze-lo sem consulta prévia aos órgãos de Fiscalização tais quais o CORI e o Conselho Deliberativo, face as consequências que este tipo de ação pode acarretar ao Clube.

Também chegou ao nosso conhecimento por notícias da imprensa, que a atual gestão está preparando um Fundo Imobiliário para “venda” de parte da Arena, inclusive resgatando projeto da gestão anterior.

Sobre isso, esclareço que independentemente da origem do projeto, se novo ou antigo, o mesmo não poderá ser viabilizado sem autorização dos mesmos órgãos, ou seja, CORI e Conselho Deliberativo, visto que em nenhum momento o assunto foi apresentado tampouco deliberado pelo Conselho Deliberativo.

Por fim, informo a Vossa Senhoria que esta presidência recebeu ofício e diversas reclamações do Conselho Fiscal e do CORI sobre a falta de respostas da Diretoria para questionamentos realizados e sobre o não cumprimento de artigos do Estatuto e da Lei Geral do Esporte, especialmente sobre a falta de transparência na prestação mensal das contas, sobre a não observância dos artigos 120 parágrafo único, 121 e 122 parágrafo 2º, dentre outros.

A título de esclarecimento, os fatos elencados acima poderão ser analisados no contexto dos artigos 81 letras F e J; 97 letras D, F, I e U; 124; 125; 131 e 136, dentre outros, todos do Estatuto Social do Sport Club Corinthians Paulista.

Com relação a Lei Geral do Esporte (Lei 14.579/2023), importante observar o abaixo reproduzido:

Art. 59. São princípios da gestão na área esportiva, sem prejuízo de outros preceitos correlatos:

I – responsabilidade corporativa: caracterizada pelo dever de zelar pela viabilidade econômico-financeira da organização, especialmente por meio da adoção de procedimentos de planejamento de riscos e de padrões de conformidade;

II – transparência: consistente na disponibilização pública das informações referentes ao desempenho econômico-financeiro, gerenciais e pertinentes à preservação e ao desenvolvimento do patrimônio da organização;

III – prestação de contas: referente ao dever de o gestor prestar contas de sua atuação de modo claro, conciso, compreensível e tempestivo, assumindo integralmente as consequências de seus atos e omissões e atuando com diligência e responsabilidade no âmbito de sua competência;

IV – equidade: caracterizada pelo tratamento justo e isonômico de todos os gestores e membros da organização, considerados seus direitos, seus deveres, suas necessidades, seus interesses e suas expectativas;

V – participação: consubstanciada na adoção de práticas democráticas de gestão direcionadas à adoção de meios que possibilitem a participação de todos os membros da organização;

VI – integridade esportiva: referente, no âmbito da gestão do esporte, à adoção de medidas que evitem qualquer interferência indevida que possa afetar a incerteza do resultado esportivo, a igualdade e a integridade dos competidores.

Art. 62. Nenhuma pessoa natural ou jurídica que, direta ou indiretamente, seja detentora de parcela do capital com direito a voto ou, de qualquer forma, participe da administração de qualquer organização esportiva que promova a prática esportiva profissional poderá ter participação simultânea no capital social ou na gestão de outra organização esportiva congênere disputante da mesma competição que envolva a prática esportiva profissional.

§ 1º É vedado que 2 (duas) ou mais organizações esportivas que promovam a prática esportiva profissional disputem a mesma competição ou a mesma série ou divisão de uma competição, quando for o caso, das diversas modalidades esportivas disputadas profissionalmente quando:

I – uma mesma pessoa natural ou jurídica, direta ou indiretamente, por meio de relação contratual, explore, controle ou administre direitos que integrem seus patrimônios; ou

II – uma mesma pessoa natural ou jurídica, direta ou indiretamente, seja detentora de parcela do capital com direito a voto ou, de qualquer forma, participe da administração de mais de uma sociedade ou associação que explore, controle ou administre direitos que integrem os seus patrimônios.

§ 2º A vedação de que trata este artigo aplica-se:

I – ao cônjuge e aos parentes até o segundo grau das pessoas naturais; e

II – às sociedades controladoras, às controladas e às coligadas das mencionadas pessoas jurídicas, bem como a fundo de investimento, a condomínio de investidores ou outra forma assemelhada que resulte na participação concomitante vedada neste artigo.

Art. 64. Para os fins do disposto nesta Lei, gestor esportivo é aquele que exerce, de fato ou de direito, poder de decisão na gestão da organização, inclusive seus administradores.

Parágrafo único. É dever do gestor esportivo agir com cautela e planejamento de risco, atentando-se especialmente aos deveres de:

I – diligência: caracterizada pela obrigação de gerir a organização com a competência e o cuidado que seriam usualmente empregados por todo homem digno e de boa-fé na condução dos próprios negócios;

II – lealdade: caracterizada pela proibição de o gestor utilizar em proveito próprio ou de terceiro informações referentes aos planos e aos interesses da organização, sobre os quais somente teve acesso em razão do cargo que ocupa;

III – informação: caracterizada pela necessária transparência dos negócios da organização, com a obrigação de o gestor, sempre de forma imediata, informar os interessados sobre qualquer situação que possa acarretar risco financeiro ou de gestão, bem como de informar sobre eventuais interesses que possua e que possam ensejar conflito de interesse com as atividades da organização.

Cabe esclarecer a Vossa Senhoria, prezado Presidente, que o presente tem o escopo de alertá-lo quanto aos riscos de se efetivar algo sem o amparo legal e regimental, lembrando sempre que os órgãos de Fiscalização estão à disposição para ajudá-lo a encontrar alternativas e caminhos seguros para o Corinthians, mas sempre observando as regras do Estatuto e da Legislação as quais estamos todos submetidos e, caso seja de sua vontade.

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